EMPRESAS FELIZES

    

Artigo publicado na Revista Vencer - nº40 - Jan/03

Todos querem felicidade em suas vidas, na de sua família. E por que não trabalhar numa empresa feliz? E a receita para isso não é só o lucro no final do mês. A felicidade depende, em grande parte, de uma equipe que saiba compartilhar valores.



Atordoado com as crises que as empresas enfrentam, comecei a pensar nas seguintes questões: "Uma empresa pode ser feliz? O que é uma empresa feliz? A sua empresa é feliz?" Perguntas que pareciam demagógicas, utópicas ou, até mesmo, que não tinham sentido no mundo dos negócios.

Passei a analisar as atitudes e reações dos dirigentes da maioria das empresas e percebi que, da forma como agem, sem dúvida esses adjetivos podem fazer nexo. "Onde já se viu falar de felicidade dentro das empresas, uma empresa não é um mosteiro; produtividade e lucro é o que interessa", dizia meu amigo Walter, um experiente executivo.

Perguntei a Walter do que era formada sua empresa e ele me respondeu: "Ora, não me venha com perguntas bobas. Capital e trabalho, isto é, uma idéia de produto, estrutura, processos e pessoas". Então complementei: "Correto, Walter, empresas só existem quando nelas existem pessoas - com sentimentos, atitudes, reações, valores, objetivos, doenças, enfim, vida".

Naquele momento, vi Walter com a fisionomia de quem percebeu alguma coisa errada no seu conceito. Foi então que ele me disse: "Pessoas. É engraçado como no dia-a-dia não pensamos desta forma". E continuei instigando-o com minhas perguntas

- Walter, você já parou para pensar por que trabalha? Por que você sai todas as manhãs de casa para o escritório?

- É claro, eu tenho que sustentar minha família, quero oferecer um pouco de paz e felicidade para ela.

- Muito bem, Walter, você respondeu minha pergunta inicial. Empresas podem e devem ser felizes. Podem porque são formadas por pessoas vivas, e devem porque ser feliz é a melhor maneira de viver. A empresa então nasce, cresce e muitas vezes morre. A forma como ela escolher viver vai determinar se ela é feliz ou não, se vai morrer ou não. E assim caímos em nossa segunda pergunta: o que é uma empresa feliz? Antes de responder, Walter, o que é felicidade na sua opinião?

- Nessa você não me pega. Felicidade não é um objetivo na vida como muitos a tratam, é um estado de espírito. O ser humano é capaz de se desenvolver para que a felicidade não só bata à sua porta, mas que ele próprio abra as portas para ela em qualquer momento de sua vida.

- Poxa! Você foi fundo mesmo, Walter. Então, se você entende que felicidade é uma escolha que podemos fazer ao encarar a vida, o que você me diz que uma empresa feliz deve fazer?

- Lá vem você com suas perguntas. Acho que não vai sair coisa muito boa, nunca parei para pensar nisso.


- Vamos, eu te ajudo. Que tal começarmos pela seguinte questão: quem paga pelo lucro que sua empresa tem?

- Os nossos clientes.

- Certo novamente. O mercado está disposto a pagar pelo lucro das empresas desde que as atitudes da empresa em relação a ele demonstrem respeito e ofereçam soluções para seus problemas. Isto quer dizer que lucro é o resultado das atitudes que sua empresa tem em relação ao mercado.

- Engraçado, esse enfoque muda tudo. Fica mais fácil para todos na empresa entenderem como aumentar o lucro. Se pensarmos no conceito econômico do lucro, vamos fazer contas e mais contas, sempre levando em consideração a empresa como única parte do processo, isto é, RECEITA-DESPESAS = LUCRO. Mas e os funcionários, o que eles pensam disso tudo?

Percebi naquele momento que Walter estava começando a se interessar pelo assunto. Fazia tempo que Walter não parava para refletir, pois estava sempre envolvido demais com a correria da vida.

- Esta é uma pergunta que você deve fazer a eles.

- Perguntar a eles, você está louco? Se abrir essa porteira, vai passar uma boiada e não vai ter lucro que dê para pagar.

- Calma, Walter. Cuidado com essa postura de chefe. Seus colaboradores querem um líder, querem ser ouvidos, precisam de respeito tanto individualmente como em grupo, querem oportunidades de adquirir novos conhecimentos e compartilhar idéias, querem ser consultados. Quantos e quantos funcionários ganham muito bem e não estão satisfeitos. Uma remuneração é justa quando essas outras variáveis estão acessíveis. Eles querem trabalhar com dignidade, não precisam de um chefe herói e que sabe tudo, querem um líder humilde que leve até eles a sabedoria.

- Espera aí: você quer que eu confie em qualquer um. Eu vou ser tapeado, dessa forma!

- Walter, muitas empresas se abarrotam de controles para não serem tapeadas e isso só faz aumentar a astúcia daqueles que não têm respeito próprio. É o efeito Pigmalião. Você deseja tanto que uma pessoa aja ou seja de uma forma que realmente acontece. Isso já foi comprovado por pesquisas nos anos 50/60 nos EUA. As atitudes da empresa de fiscalizar seus funcionários, impedir sua participação nos processos de decisão ou cercear seus direitos e vontades, geralmente levam a confrontos. Walter, numa empresa em que a equipe é valorizada, o próprio indivíduo se afasta ou a equipe faz esse trabalho quando seus valores não combinam com os do restante.

- Tá bom, mas isso pode virar uma confraria!

- Concordo. E, para não virar essa confraria, precisamos ter claro o que nos une na empresa.

- Ah, você está falando dos nossos objetivos?

- Não é só isso. Os objetivos da empresa devem ser compartilhados com todos, isto fará com que entendam aonde a empresa quer chegar facilitando o que faremos no dia-a-dia, mas os valores representam essa liga que regerá nossas atitudes. Se formos a fundo, entenderemos que, se os valores forem bem compartilhados, não precisamos de regras e procedimentos. Quantos chefes vejo juntando clipes no chão da empresa dizendo em alto tom que aquilo vale dinheiro e não deve ser desperdiçado, e no final do expediente bafora que está cansado de juntar clipes. Não seria mais fácil compartilhar esse valor com todos e não ter desperdícios mais significativos?

- Puxa vida, começa a fazer sentido. Acredito que numa empresa que adota essas atitudes os funcionários vão colocar mais amor no que fazem, vão querer ir trabalhar porque gostam, não para um emprego qualquer em troca do salário. Trabalhar assim faz a gente querer encarar desafios, resolver problemas, cooperar com os outros.

- É isso mesmo, Walter, as pessoas passam a ser positivas em suas atitudes, a forma de pensar muda, dificuldades viram desafios e são encarados com firmeza.

- E isso tudo reflete no cliente.

- Walter, relação com o cliente é como um casal de namorados: estão sempre conquistando um ao outro, fazendo surpresas e mais surpresas um ao outro.

- Estou me sentindo pequenino.

- Não precisa se sentir assim,meu amigo. Pense que ser grande é quando as atitudes são reconhecidas, não só as conquistas e a riqueza são o resultado de ser feliz.

- É. Ser uma empresa feliz não é difícil, é uma questão de atitude.


Dirceu Ferreira


Revista Vencer - nº40 - Jan/03 -  Artigo erroneamente creditado ao consultor e amigo Roberto Adami Trajan

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